domingo, 13 de dezembro de 2009

Integrar ambiente e agricultura é a meta

Douglas Marçal   (Foto: Douglas Marçal)
A senadora e ex-ministra do Meio Ambiente, Marina Silva (PV-AC) esteve na quinta-feira na região de Maringá, onde passou o dia com a família. O motivo da visita foi a formatura da filha caçula Mayara, 17 anos, que acaba de concluir o ensino médio no Instituto Adventista Paranaense, de Ivatuba.

A reunião familiar foi uma pequena brecha na intensa agenda da senadora, que na tarde de sexta-feira, embarcou para Copenhague, capital da Dinamarca e sede da cúpula climática mundial. No encontro que define limites para o aquecimento global, a senadora é uma das personalidades mais esperadas.

Em 2007, Marina foi apontada pelo periódico britânico The Guardian como uma das 50 pessoas que podem ajudar a salvar o planeta. Para a senadora, as mudanças no Código Florestal são nefastas e modificam leis que levaram anos para se consolidar .

"Ajustes podem ser feitos, são necessários, mas não no sentido de um rebaixamento, que será prejudicial inclusive para a agricultura", comenta a senadora, que defende o uso da tecnologia da Embrapa para resolver o conflito entre preservação e produção.

Marina acredita que a meta brasileira em Copenhague - redução de 38,9% nas emissões de CO2 nos próximos anos - funcionará como uma forma de constrangimento ético para as nações poluidoras. Nesta entrevista, a senadora diz que a mensagem dela na cúpula global será de persistência.

"A oposição entre ambientalistas e ruralistas não é boa. Neste século, teremos que resolver duas situações: como desenvolver protegendo e como proteger desenvolvendo''.

"A mensagem não é de otimismo, porque, infelizmente, a responsabilidade ética e política da maioria das autoridades do planeta está muito aquém do que ele precisa''.

O Diário - Com a aproximação de 2010, a tendência é a de que o ritmo de trabalho tome cada vez mais o tempo da senadora para a vida pessoal? Como a senhora se prepara para esta fase?

MARINA SILVA - Como fiz até hoje. Sempre tive uma agenda muito pesada. Quando era ministra, andei pelo País inteiro, tenho visitado e conhecido o Brasil nos últimos 14 anos. Também tenho qualificado cada vez mais o contato com a minha família e com os meus amigos. Estou aqui (em Maringá) para a formatura da minha filha de 17 anos, que concluiu o segundo grau no Instituto Adventista Paranaense (IAP). Depois retorno para Brasília e vou direto para Copenhague, para a convenção do clima.


O Diário - Uma das mais importantes discussões nesta semana foi sobre o Código Florestal, que divide produtores rurais e ambientalistas. Como alcançar o equilíbrio entre a produção e a preservação?

MARINA SILVA - Vejo que essa oposição entre ambientalistas e ruralistas não é boa. Vivemos um século em que teremos que resolver duas situações: como desenvolver protegendo e como proteger desenvolvendo. No meu entendimento, a mudança que está sendo proposta para o Código Florestal é nefasta. Mexe em legislações que demoraram mais de 20 anos para serem consolidadas, entre elas a lei que estabeleceu o Sistema Nacional de Unidades de Conservação, a lei dos crimes ambientais, a lei que estabelece a gestão de florestas públicas, mudando as atribuições do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama). Isso é uma atitude, de setores que não compreenderam ainda que nós, no lugar de mudar o texto, temos que passar no teste. Isso se faz procurando a inovação tecnológica adequada para produzirmos mais, utilizando cada vez menos recursos naturais. Todos sabem que quando as florestas são destruídas, perdemos os recursos hídricos. Quando não cuidamos adequadamente da terra, perdemos a produtividade. No Brasil, já temos 70% de área degradada. É fundamental um esforço para que se consiga a integração entre meio ambiente e agricultura sustentável, em uma mesma equação. Temos que buscar as novas tecnologias da Embrapa, que já desenvolveu inovações que permitem o aumento da produtividade sem precisar passar por cima da legislação. Ajustes podem ser feitos, são necessários, mas não no sentido de um rebaixamento, que será prejudicial, inclusive, para a agricultura.


O Diário - Como a senhora avalia a proposta brasileira no encontro de Copenhague?

MARINA SILVA - A proposta brasileira é fruto de uma pressão forte da sociedade. Infelizmente, até três meses atrás, o governo não discutia as metas de emissão de carbono. Eram muito refratários em relação a elas. Graças à articulação de cientistas, de organizações não-governamentais, do Congresso Nacional e do setor empresarial que tem visão estratégica, o governo assumiu uma meta. É uma proposta de redução sobre emissões projetadas, não sobre as consolidadas, mas é um avanço. O Brasil tem um papel duplo: tanto a contribuição junto aos países em desenvolvimento, quanto para os países desenvolvidos. Nossa proposta leva ao constrangimento ético de países que emitiram historicamente, como os Estados Unidos e União Europeia, para que assumam metas mais ousadas. Também leva os países emergentes a se comprometerem com as metas de redução na atualidade, porque as emissões da China já representam 26% das emissões de CO2. O Brasil tem um papel importante, não pode simplesmente ir a Copenhague como uma ação protocolar. Temos que fazer um esforço. Vou para participar de diversos eventos, um deles, com várias líderes, no sentido de mostrar a eles a situação de emergência em que estamos.


O Diário - Qual mensagem que a senhora pretende deixar em Copenhague?

MARINA SILVA - A necessidade de mudança na visão de desenvolvimento que se teve até hoje. As economias dos países podem crescer, gerar emprego, renda e qualidade de vida. Temos, no entanto, que dissociar tudo isso das emissões de CO2. Temos que apostar em novas fontes de energia e em desenvolvimento sustentável, que diminui as emissões em todo o setor energético, nas indústrias, no uso da terra e na agricultura. No Brasil, é preciso controlar ainda o desmatamento, que é o principal responsável pela quantidade emitida. É uma mensagem não puramente de otimismo, porque infelizmente a responsabilidade ética e política da maioria dos políticos do planeta está muito aquém do que ele precisa. Mas é uma atitude de persistência da sociedade brasileira, que levou o País a assumir as metas apresentadas agora. O plano de combate ao desmatamento, implementado na minha gestão, desde 2004, fez com que o desmatamento caísse e diminuísse em 2 milhões de toneladas de CO2 nesses anos. A atitude de persistência é o que há de mais importante para o planeta e para o Brasil.


O Diário - O Brasil está pronto para eleger uma presidenta?

MARINA SILVA - Os brasileiros têm dado demonstrações constantes de que pode vencer as próprias limitações. Fomos capazes de conquistar nossa democracia e consolidá-la, elegemos um sociólogo, elegemos um operário. Evidentemente estamos prontos para eleger uma mulher. Não apenas por isso, mas pelas ideias e os projetos que tem. Não é uma disputa entre homem e mulher. É de quem pensa melhor o Brasil, quem está mais atualizado com os desafios que o planeta atravessa. Estamos diante de uma crise ambiental sem precedentes. Precisamos de uma visão estratégica de como desenvolver o País com visão estratégica, com sustentabilidade na área econômica, na defesa dos interesses sociais, da educação, da moradia e da saúde para as pessoas. Ao mesmo tempo, temos que proteger as bases naturais do nosso desenvolvimento

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